> Escritos: Doze - II

2.2.07

Doze - II

Anos passaram. Um deles deixou simplesmente de aparecer, só souberam dele outra vez quando morreu, décadas depois. O que estivera preso apareceu num jantar, reabilitado, e contou como refizera a vida e estava novamente com eles. Foi acarinhado como o filho pródigo que retornara ao pai. No ano seguinte, voltou o que estivera no estrangeiro; tinha feito fortuna, constituído família. Explicou-lhes que o seu lugar era agora longe da pátria, no país que o tinha acolhido e que o tinha feito homem rico e poderoso, mas que viria sempre aos jantares anuais, sem falhas. E como homem de carácter, cumpriu, sem falhas.
As coisas pareciam reencaminhar-se. O grupo já não incluía os doze mas os que restavam, os que queriam reencontrar-se. E foram passando os jantares, os anos, foram envelhecendo. Souberam da morte do que tinha abandonado os estudos, souberam da ida para o estrangeiro do que tinha engravidado a namorada que era agora a sua mulher. Houve um ano em que um deles anunciou que lhe tinham descoberto um cancro e que para o ano não estaria lá. Começaram a encontrar-se mais vezes nos funerais uns dos outros do que em ocasiões festivas.
Um ano não apareceu o que tinha dito que viria sempre do estrangeiro. Souberam instintivamente que mais um amigo havia morrido, pois ele seguramente não faltaria à palavra. Tinham então perto de 50 anos e nem metade deles tinha chegado ao meio século de vida com vida. Foi com surpresa que, em mais uma reunião, apareceu o companheiro que tinha ido para o estrangeiro com a família. Voltara por saudades do país, da língua, do sol, mas sobretudo pelas saudades dos companheiros ainda vivos.
Eram cinco que agora, a cada ano que passava, se juntavam para contar estórias das suas vidas, das suas famílias, mas sobretudo para se relembrarem do passado que estava cheio de promessas brilhantes, potencialidades e tudo o mais que a juventude e os seus sonhos incutem nos jovens. Talvez por isso, talvez por ter bebido uns copos de vinho a mais, nessa noite um deles foi para casa e enforcou-se. Eram agora quatro.
Passaram-se anos, passaram-se décadas. Agora os que iam eram os que restavam, já não havia surpresas quando alguém não aparecia. Até que só dois restavam e depois, só um restava para ir ao funeral do outro e chorar pelos onze companheiros que haviam faltado à promessa de a cada semana, mês, dois meses, ano que passavam se reunirem para um jantar em que os doze voltavam a ser os rapazes que foram, os rapazes que sabiam que o futuro lhes pertencia e que nunca, nunca se separariam.



RCA