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15.1.07

Nocturno - op. 4

Abro os olhos e expiro. Estou aninhado no chão, aos pés da cama. Sento-me nela e olho instintivamente para a direita: o espelho agora está lá.
Suspiro de alívio. Olho para o que se passa lá fora, a cidade, minha companheira de insónia. Mas não é a minha cidade.
É, mas está com as cores invertidas, como o negativo de uma fotografia. Sinto o coração bater mais rápido, os pulmões a expandirem-se, as pupilas a dilatarem-se. Levo a mão ao coração; lá está ele, fiel, a bater no lado direito.
No meu tímpano furado, o esquerdo, segreda-me uma voz suave, quente, esperançada, acompanhada pela melodia que o pássaro estava a cantar, tocada em piano:


- Isto está tudo a passar-se na tua mente, eu conheço-te. Eu conheço-te. Isto não é verdadeiro. Não há regras, não há realidade, é tudo tão fácil… se acreditares, claro…

Pouso as mãos na cama. A minha mão direita toca num calcanhar suave. Pelo canto do olho, vejo uma cabeça coberta de longos cabelos castanhos deslizar na almofada.