> Escritos: Doze - I

2.2.07

Doze - I

Eram doze companheiros, colegas, camaradas. Eram homens pela razão que os rapazes se transformam em homens: partilharam as primeiras alegrias, as primeiras desilusões, euforias, tristezas e fizeram-no juntos. Desde sempre se dizia que aqueles doze chegariam longe, que seriam o orgulho dos pais. Fôra assim desde que começaram, no liceu, a fazer tudo como um grande grupo de irmãos.
Eram unidos pelo sentimento mais forte que pode unir pessoas que não sejam da mesma família, o amor. Era um amor sadio, próprio de quem confia plenamente naqueles que estão a seu lado e que sabem que essa confiança é recíproca. E era por isso que nunca se separavam, apesar das querelas, apesar das altercações, pois sabiam que precisavam uns dos outros. Foi assim que passaram a juventude, com uma rede de apoio em que todos se apoiavam mas que todos suportavam.
Foi no seio dos doze que se soube da depressão de um deles, foi através dos doze que foi ultrapassada. Foi com o apoio de todos que se conseguiu enfrentar a morte do pai de um, da mãe de outro. Foram os doze que celebraram os aniversários, que comemoraram os sucessos escolares e amorosos, foram os doze que festejaram a entrada de todos para o patamar seguinte, a faculdade.
Separaram-se fisicamente mas continuavam a juntar-se sempre, religiosamente, sextas feiras à noite para fazer o apanhado da semana. Jantavam e depois iam sair à noite, divertimento próprio dos jovens das suas idades. Começaram a ter namoradas; começaram a ter menos tempo uns para os outros. Mas sempre que podiam faziam qualquer coisa juntos, só eles, os doze, o grupo. E um dia disseram: “por mais que nos separe, haveremos sempre de fazer um jantar por mês, à sexta feira. Sem mulheres, sem filhos, só nós.”
Mas as semanas acumulavam-se entre as ocasiões em que se viam; reformularam a promessa: “haveremos de fazer um jantar de dois em dois meses!”. Mas ao entrarem no mundo do trabalho, cada vez menos podiam jantar de dois em dois meses. E o tempo decorria cada vez mais depressa.
Foi, com surpresa, que souberam que um deles abandonou a faculdade. A pressão era muita, preferia ir trabalhar já e fazer pela vida, mas continuava a vê-los sempre que podia, ainda que fugazmente, até desaparecer quase completamente. Outro engravidou a namorada e começou a trabalhar enquanto estudava à noite, esse quase nunca mais o viram. E ainda outro, que foi o melhor do curso, sem surpresas aceitou um convite para ir trabalhar para o estrangeiro. Passariam anos até que o voltassem a encontrar.
Um meteu-se na droga, roubou casas e carros, foi preso e na prisão ficou durante cinco anos. Eram, então, cada vez menos que compareciam nos jantares esporádicos que se iam fazendo.
Até que um ano, quando iam ter com os outros, dois deles morreram num horrível desastre, enquanto estavam na auto-estrada. Ao saber disto, o que lhes era mais chegado, tirou a própria vida poucas semanas depois. Tentaram perceber porquê; descobriram que tinha perdido tudo ao jogo. A morte dos companheiros foi o catalisador para o suicídio.
E antes mesmo de todos fazerem 25 anos, o grupo dos doze estava desfeito. Aquilo que parecia imutável foi derrubado com um conjunto de circunstâncias que se suponham ineficazes contra aquela muralha de doze torres que era a sua união. Restavam então cinco que se reuniam regularmente, mas mesmo assim já só de ano a ano. Mas continuavam sempre, sem mulheres, sem filhos, só eles.