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10.11.04

Redenção - Parte 5 - Carro

A meio da viagem, ocorre-me um pensamento. A pele dos estofos (do carro que aluguei) é macia e suave como a pele dela. O volante desliza nas minhas mãos como as suas formas, o ruído do motor faz-me lembrar o seu ronronar de prazer quando estava nos meus braços. Fecho os olhos e vejo-a, de braços abertos, a chamar por mim. Abro os olhos e sou encadeado pelos faróis de um carro que vem em sentido contrário. Assustado, desvio o carro para a berma.
Fico uns minutos de olhos fechados, a respirar fundo e a ouvir o som de aviso dos quatro piscas ligado. Quando me sinto mais calmo, volto à estrada. Ainda tenho muito para andar, e não quero apanhar chuva, para não me lembrar dos momentos maus. Aliás, tento não pensar também nos bons momentos; concentro-me apenas na condução. Fixo os olhos nos marcos da estrada, iluminados pelos faróis.
Guio até ao fim da estrada, até ao fim da noite, até me perder na escuridão. Até me embrenhar nas trevas, onde não há luz, nem som, nem nada. Só silêncio, escuridão e solidão.