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20.10.04

Esclarecimentos - Parte III - Fim

- E assim chegamos à terceira e última parte. Após esse tempo, o Rodrigo disse que precisava de mim. Eu também precisava dele e voltámos a estar juntos. Eu era agora muito feliz, porque ele também era feliz. Éramos felizes. Foi então que a Inês apareceu. Eu já a conhecia, mas o Rodrigo não. E conheceu-a, por acaso, numa viagem que fizeram. Eles os dois e mais gente. Mas não fiz muito caso; afinal, ele conhecia imensas raparigas e não era agora uma que iria causar problemas. Mas ele voltou diferente... E, mais tarde, quando numa ocasião em que nós os dois estivémos com a Inês e as amigas dela, eu começei a sentir perigo. Ele estava muito tempo, a meu ver, com elas. Foi talvez egoísmo meu, devia ter dado-lhe espaço para fazer amigos e amigas, mas não conseguia. E foi por isso que tudo aconteceu, e foi por isso que estamos todos aqui hoje. Porque ele queria outra vez um tempo para pensar, espaço só para ele. Fui orgulhosa e decidi que não. Se ele queria um espaço, então ia tê-lo definitivamente. Na altura, discutíamos bastante, quase sempre por culpa minha. Não faço aqui papel de vítima, sei muito bem que a maior parte das vezes, era eu que estragava a nossa relação. Então acabámos. Apenas um dia depois apercebi-me do erro tremendo que tinha cometido, mas sou muito orgulhosa para voltar assim atrás. Percebo agora que o orgulho é mau para uma pessoa que ama outra. Ele seguiu o seu caminho e eu, o meu. Só que não há duas sem três, não é? - falava agora com lágrimas a cairem livremente pela cara, já não as tentava conter - Um dia, o Rodrigo chegou ao pé de mim e disse-me que tinha estado com a Inês. Disse-me que tinha sido uma coisa da ocasião e que não haveria mais nada entre eles. Uma coisa carnal, conclui eu. Mas porquê? Porque é que era sempre ele a ceder a esses impulsos? Fiquei... chocada. Mesmo sabendo que ele não seguiria nenhum relacionamento com a Inês, fiquei inquieta. Também era impossível, a Inês mora quase a 300km de Lisboa... Sabia que três vezes eram vezes demais. E decidi agir. É por isso que estamos todos aqui.
- Mas... Não percebo... Rita, o que é que queres... - a Inês falava lentamente, tentando perceber o que é que tinha feito de mal, para estar ali.
- Pois não, não percebes. É natural. Só que desta vez, nenhum está isento de culpas. Tu, Rodrigo, porque durante a tua vida toda, viste a Inês umas 5 vezes. E tu Inês, porque sabias perfeitamente que... - a Rita procurava as palavras quando a Inês a interrompeu.
- Mas se vocês nem sequer andavam na altura... O que é que eu fiz de mal? - disse a medo.
- Foi a gota de água, percebes? Tu és uma coitadinha que anda por aqui, és um acaso. Não é por seres tu especialmente, ou se calhar até é, mas é mais por ele - ao dizer isto, apontou a pistola para o Rodrigo, de forma negligente, que este até se assustou, com medo que aquilo disparasse inadvertidamente. A Rita apercebeu-se disto e aproveitou - Com medo, Rodrigo? Ou queres refutar alguma das minhas acusações? - usava agora um tom de escárnio.
- Eu só acho que estás louca... Porque é que estás a fazer isto, Rita? Não poderias simplesmente ter-me dito isso tudo, sem teres feito esta palhaçada toda? Tu é que estás a ceder a impulsos, neste caso violentos... Foste sempre assim, era por isso que nunca dava certo, era por isso que eu pedia tempo para pensar e respirar, sequer... - disparou o Rodrigo. Tentava agora tomar conta da situação. - Eu sempre gostei de ti, eu sempre te amei, mas tu oprimias-me. Às vezes parecia que não conseguia respirar sem ter que te dar justificações. Isso doía, Rita.
- Achas que eu não sei? Achas que não estou suficientemente arrependida? Eu só queria ter-te perto de mim... Tinha tanto medo de te perder! Mas é a história da minha vida: erro após erro, e raramente aprendo a lição. - A Rita falava com uma voz amarga e a Margarida começou a sentir pena dela. - Mas o que mais doeu foi toda a gente ter-se passado para o lado dele... Todos os nossos amigos em comum, até pessoas que eu conhecia há mais tempo, todos ficaram do lado dele. Porque ele era mais giro, era mais fácil gostar-se dele... Até hoje, acho que a única pessoa que realmente me percebeu foi o Rodrigo, mas também não me percebeste... Não percebeste que preciso que alguém esteja sempre ao meu lado, não percebeste...
- Rita, porque é que não pões a arma no chão, e nos soltas? - Perguntou o Rodrigo - Não achas que seria melhor se acabasses com isto?
- Não és tu que tomas as decisões! Houve tempos em que sim, eu cedia a tudo, Rodrigo, mas agora não. Agora sei o que tenho a fazer. Não vou tomar as minhas decisões, mas também não vais ser tu. Vai ser esta menina - disse a Rita enquanto afagava o cano da pistola.
- O quê!? Estás maluca? - gritou a Joana.
- Eu deixei-te falar? - perguntou a Rita - Então cala-te, senão és calada à força! - Ao ouvir isto, as três raparigas e o Rodrigo encolheram-se. Já tinham percebido que ela não estava a jogar com o baralho todo.
- Rita... pensa bem no que estás a fazer... De certeza que não queres matar alguém... O que é que elas te fizeram? Deixa-as ir em paz... Ficamos só aqui os dois, ficamos a conversar...
- Eu não gosto de falar, Rodrigo. Eu só digo aquilo que acho que seja estrictamente necessário ser dito. E acho que estamos a chegar ao fim. - Ao dizer isto, a Rita virou-se de costas para o Rodrigo e não viu o que ele estava a fazer.
O Rodrigo tinha estado a maior parte do tempo a tentar romper as cordas que amarravam os seus pulsos, por fricção nos bordos de metal da cama. E consegui soltar-se, estava agora só à espera de uma oportunidade para inverter a situação. E quando ela chegou...
Levantou-se de um salto, agarrou a Rita por um braço e com o outro agarrou na pistola. Empurrou-a para longe e apontou-lhe a pistola. Era a vez dele de controlar.
- Rodrigo, antes de fazeres qualquer coisa, lembra-te só que eu amo-te. - disse calmamente a Rita.
- Eu sei. Pena é que não me deste oportunidade de te dizer o mesmo antes de me trazeres até aqui. - replicou o Rodrigo.
- O que é que vais fazer? - perguntou ela.
- É como tu disseste, Rita. Às vezes devemos deixar que a pistola tome as decisões por nós. E agora vai ser assim. - o tom da conversa era cordial. Era estranho que as duas pessoas que estavam naquela situação, fossem duas pessoas que se amavam tanto.
- Amo-te - disse a Rita.
- Eu também - disse o Rodrigo, e premiu o gatilho.
Nada. Não houve disparo.
- Achas mesmo que eu me poria numa situação em que te poderia magoar, Rodrigo? Ou que me pudesses magoar? Mas agora já sei... - Ao dizer isto, a Rita virou-lhe costas e dirigiu-se para a porta do armazém. Atrás dela, o Rodrigo deixou-se cair ao chão enquanto chamava por ela.
- Rita, espera! Espera! Desculpa... desculpa! Eu amo-te! - Chorava convulsivamente.
Calmamente, a Rita saiu. Apanhou o sol na cara, tinha nascido o dia entretanto. Inspirou o ar fresco da manhã. Apesar de tudo, ainda amava o Rodrigo. E sabia que iria ser assim para o resto da sua vida.

RCA

4 Comments:

Blogger Miguel C. Romão said...

Clap Clap Clap Clap Clap Clap

6:10 da tarde  
Blogger Diogo said...

Nice one. Bem estruturado e c final f*dido.

Me likes

11:59 da tarde  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

11:24 da tarde  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

11:25 da tarde  

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