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20.10.04

Esclarecimentos - Parte I - Princípio

Abriu os olhos lentamente. Ainda sentia a cabeça andar à roda e teve que fazer um esforço hercúleo para se soerguer. Olhou à sua volta: estava deitado numa cama, que parecia estar no meio de um armazém vazio.
- Bom dia, Rodrigo, ou deveria dizer, boa noite? - ouviu atrás de si.
Virou lentamente a cabeça e viu-a.
- Rita!? - exclamou, incrédulo - O que é que se passa? O que é que aconteceu? Onde é que eu estou?
- Calma... As coisas a seu tempo. - disse a Rita.
Levantando-se da cadeira, andou até à cama onde estava deitado o Rodrigo. Este aproveitou para a ver melhor. A Rita tinha uns 24 anos, não era muito alta e os cabelos castanhos e compridos contrastavam com a brancura da sua cara. O seu sinal mais característico era, talvez, os seus olhos: castanhos, normais, mas tinham um ar ausente, vago, às vezes assustador. Não era uma rapariga própriamente muito atraente, mas tinha um aspecto de pessoa em quem se podia confiar. Mas naquele momento o Rodrigo já não percebia nada e sabia que, acima de tudo, ela não deveria estar muito bem da cabeça.
- Bem, acho que já chega de brincadeiras, vou-me embora. - anunciou o Rodrigo, enquanto se levantava. Mas ao fazê-lo soltou uma exclamação surda: os seus pulsos tinham sido amarrados à cama - O que é que se passa aqui? Porque é que estou preso a esta cama, Rita?
- És um bocado impaciente... Mas está bem, vou-te contar porque é que estamos aqui. Estás atado a essa cama porque era a única maneira de eu fazer-te ouvir o que tenho para dizer - explicou a Rita enquanto se aproximava mais da cama. Viu que ele estava com um ar verdadeiramente espantado e confuso, o que não era normal no Rodrigo. O Rodrigo era um rapaz também de 24 anos, por sinal parecido com a Rita, mas mais moreno e talvez um pouco mais baixo. Tinha os olhos verdes e o cabelo também era castanho. Era, na visão das raparigas, muito, muito giro. Aparentava normalmente um ar calmo, mas agora estava inquieto. Sabia que a Rita era capaz de muitas coisas, mas nunca pensou que era capaz de o prender a uma cama só para falar com ele!
- Não achas que chega de joguinhos? Já quando andávamos tinhas estas manias, mas isto? Rita, o que é que se passa? - perguntou o Rodrigo, com uma voz calma, a contrariar o aspecto da sua cara.
- Não me venhas com essa vózinha! Eu sei muito bem que tentas sempre convencer toda a gente assim. Afinal, não foi assim também com as outras? Eu sei, Rodrigo, eu sei... E é por isso que hoje estamos todos aqui!
- Todos? Todos quem? - Ele estava cada vez mais a leste do que se passava.
- Olha ali para o fundo. - A Rita apontou para um canto e ele reparou em três camas que ainda não tinha visto. E nelas...
- Quem é que está ali? Mais gente!?
- Agora é só gente, Rodrigo? Sim, também suponho que para ti foi só uma coisa carnal, porque tu disseste que ainda gostavas de mim... - A Rita disse isto com um ar meio irónico, meio entristecido. Caminhou para as três camas e trouxe-as uma por uma para junto da cama onde estava o Rodrigo, uma vez que as camas tinham rodas. O Rodrigo viu então horrorizado que, deitadas nas camas, estavam três raparigas.
- Margarida? Joana? Inês?! O que é que lhes fizeste???
- Calma, elas estão só a dormir... Daqui a pouco já acordam. Depois pomos todos a conversa em dia - disse a Rita com um ar sinistro. - Entretanto, vamos nós falando. - trouxe a cadeira para junto dele e sentou-se novamente - Sabes porque é te trouxe a ti e a elas todos cá? Para ver como é que vais reagir a isto, porque tu arranjavas sempre uma desculpa ou uma explicação. E agora quero ver se manténs a tua palavra em frente delas, se tens mesmo carácter.
- Solta-me! Solta-as! O que é que estás a fazer, Rita? Estás louca? - gritou o Rodrigo.
- Se calhar agora estou... Em tempos estive louca, mas de amor... Por ti, Rodrigo, e tu sabes muito bem. Mas acho que sempre preferiste brincar um bocado com os meus sentimentos. E agora vais perceber que isso não se faz. - estranhamente calma, a Rita foi buscar um objecto que estava em cima de uma mesa encostada à parede. Quando voltou, trazia na mão uma pistola.